A literatura produzida por Montessori permeia o entendimento de uma “Educação dos Sentidos”, devido seus estudos anteriores da obra de Itard¹ e Séguin², bem como de suas próprias observações científicas. Todo esse envolvimento converge a um entendimento (cunhado no capítulo “A incompreensão” do livro “O segredo da infância”/”A criança”) que esclarece ser através dos sentidos que o indivíduo se relaciona e inaugura compreensões próprias de mundo. Como se nossos instintos e reflexos nos levassem a constantes adaptações ao meio. “Por isso o indivíduo não é vítima dos seus sentidos, mas é arrastado por eles. Os sentidos trabalham ao serviço do seu possessor, segundo uma guia” (MONTESSORI, [1949?], p. 90). A proposta de educar para e educar os sentidos poderia ser resumida grosso modo com o princípio de “auxiliar o desenvolvimento natural da criança” (MONTESSORI, 2017, p. 109, grifo da autora). No fito de trazer à luz aquilo que temos de mais acessível ao nosso corpo desde o nascimento, que são o movimento e os sentidos.

Para além de todo o arsenal de materiais sensoriais incrivelmente estruturados e organizados pela autora (confira a sessão Sensorial, em nossa loja), com o passar do tempo, foi possível se inspirar na ideia montessoriana de Educação dos Sentidos para ampliar as possibilidades e experiências. Não encontraremos na bibliografia de Montessori uma mesa sensorial, mas sim um embasamento que nos leva a compreender como este item concorda com seus propósitos. As ideias de trabalho nela serão muitas, mas o que nos importa saber é que a criança “observa o que a rodeia e a experiência demonstrou-nos que é levada a absorver cada coisa” (MONTESSORI, [1949?], p. 90). Dessa maneira, ter um local em que se possa organizar coerentemente e com clareza o trabalho a ser desenvolvido é um algo interessante e que estimula o desenvolvimento dessa dita organização, podendo ser referenciada pela própria criança que aquele é o local adequado e seguro para realizar certos trabalhos. Esse fato ainda mostra a viabilização da autonomia e independência necessárias para agirmos inteligentemente no ambiente.

Confira nosso post sobre a “Educação Sensorial sob a visão da neurociência”.

Quando observamos para agir e agimos para observar, estamos exercendo a Educação Sensorial de maneira direta, estabelecendo esquemas neuronais importantes ao nosso desenvolvimento. Movimento esse que “está ligado à própria personalidade e nada pode substituí-lo” (MONTESSORI, 2019, p. 120), assim como nossas sinapses acerca dos movimentos. Interagir com e sob a Mesa Sensorial nos proporciona esse movimento de desenvolvimento, não só de nossos sentidos; bem como é boa parte da metodologia em questão. Montessori (2019, p. 121) aprofunda ainda a questão Sensorial colocando que: “O problema fundamental da vida humana, e portanto da educação, é que o eu consiga animar e tomar posse de seus próprios instrumentos motores, para poder obedecer, em suas ações, ao elemento que é superior às realidades vulgares e às funções da vida vegetativa, ‘aquele elemento’ que em geral é o instinto, mas que no homem faz parte da inteligência”.

Como se usa a mesa de experimentação Montessori?

Uma atividade cada vez

Cada vez que a criança usar a mesa de experimentação, apenas uma atividade lhe será apresentada. Dessa maneira, a criança sabe o que nela contém e as possibilidades apresentadas pelo adulto ou descobertas por ela mesma.

Sempre à altura da criança

A bandeja ou a mesa de experimentação devem estar acessíveis à criança. Isso despertará sua curiosidade, de tal forma que a aprendizagem surge de seu próprio interesse.

Ordem na apresentação

O mais provável é que, ao final da atividade, tudo esteja desordenado (aos olhos do adulto). No entanto, quando apresentamos a proposta, a criança deve encontrar tudo organizado previamente.

Sempre deve estar limpa

Quando a criança for trabalhar na mesa de experimentação, deve encontrá-la com asseio. Se a atividade é com líquido, deve encontrar tudo limpo e sem nada derramado, por exemplo; isso a cativa e se torna mais atrativo aos olhos da criança.

Por que usar a mesa sensorial para apresentar os materiais à criança?

  • Delimita cada atividade de forma individual.
  • Facilita a tarefa de recolher e retirar os materiais.
  • Contribui a criar uma ordem clara no espaço e na mente da criança.
  • Dá o protagonismo que merece cada atividade e material.

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Benefícios do trabalho com a Mesa de Luz

A superfície luminosa é capaz de atrair a atenção da criança, mantendo-a com um alto nível de concentração. Manipulando os recursos disponíveis para trabalho com a mesa de luz, a criança vai construindo o conhecimento. Uma sugestão de uso seria o uso de papel celofane ou outros materiais translúcidos.

¹Jean Marc Gaspard Itard: nasceu em 24/04/1774, em Oraison, no Vale de Durance, na França. Médico psiquiatra, considerado um dos pais da Educação Especial; conhecido pelo tratamento de uma criança encontrada em Aveyron (1801 – 1807) e também por ter descrito pela primeira vez o que hoje chamamos de Síndrome de Tourrette de uma de suas pacientes (1825). Morreu aos 64 anos, em Paris, deixando tudo que tinha ao Instituto para Surdos-Mudos de Paris (TEZZARI, 2009).

²Édouard Séguin: nasceu em 20/01/1812, em Clarency, na França e morreu aos 68 anos em Nova Iorque, nos Estados unidos; descendente de uma família de médicos, mas estudou inicialmente Direito, para depois render-se à medicina como era o costume de sua família. Seu pai foi colega de Jean Itard, o que possibilitou seu contato imediato com este médico já famoso na época. Foi o primeiro a descrever o que hoje chamamos de Síndrome de Down, considerado um dos pais da Educação Especial, principalmente para pessoas com deficiência intelectual. Foi também professor, pois criou um método para educar seus pacientes. Destacou a importância das noções, por meio de experiências perceptivas diretas, comparação de pesos, texturas, cores entre objetos, por exemplo (TEZZARI, 2009).

Referências bibliográficas:

MONTESSORI, Maria. Mente absorvente. Tradução de Pedro da Silveira. Rio de Janeiro: Portugália, [1949?].

MONTESSORI, Maria. A descoberta da criança: pedagogia científica. Tradução de Aury Maria Azélio Brunetti. Campinas: Kírion, 2017.

MONTESSORI, Maria. O segredo da infância. Tradução de Jefferson Bom bachim. Campinas: Kírion, 2019.

TEZZARI, Mauren Lúcia. Educação Especial e Ação docente: da medicina à educação – Porto Alegre, 2009 243 f. Tese (Doutorado em Educação) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Faculdade de Educação. Programa de Pós-Graduação em Educação. Porto Alegre, 2009.

Referência das imagens:

Arquivo pessoal