“Nenhuma descrição, nenhuma imagem de nenhum livro podem substituir a vista real das árvores em um bosque com toda a vida que acontece em volta delas.” (Maria Montessori)

Maria Montessori (1870 – 1952) acreditava que a natureza é um elemento fundamental para o desenvolvimento infantil, proporcionando um ambiente rico em experiências sensoriais e oportunidades de aprendizado. Para ela, o contato direto com a natureza permite que a criança explore, descubra e construa seu conhecimento de forma autônoma e prazerosa.

Sua filosofia defende que a natureza é a “sala de aula” perfeita, um laboratório vivo onde a criança pode aprender através da experiência direta. Segundo ela, as mudanças de estação, por exemplo, oferecem um espetáculo de transformações que despertam a curiosidade e o senso de observação.

E o que Maria Montessori nos deixou como legado em se tratando do trabalho pedagógico a respeito das estações do ano?

Em um primeiro momento, como resposta à essa pergunta, poderá vir à nossa mente um de seus materiais intitulado “O Círculo das Estações Montessori” (um material didático que visa apresentar às crianças o conceito das estações do ano de forma concreta e sensorial, composto por um círculo dividido em quatro partes, um para cada estação, e por um conjunto de imagens que retratam cenas típicas de cada período).

Este material é, certamente, uma excelente oportunidade de explicitar às crianças a “organização” do tempo em estações. Mas Montessori vai muito além!

Não se trata somente de metodologia, e por isso, o trabalho com as estações do ano não pode ser simplificado em um único material (o que é substancial de se trazer à tona, uma vez que muitas vezes a perspectiva montessoriana se resume, equivocadamente, aos seus materiais pedagógicos).

Montessori abarca a filosofia e a educação cósmica de forma muito mais profunda: ela defende que, através do contato com a natureza, a criança desenvolve um senso de responsabilidade e cuidado com o meio ambiente de forma muito mais intensa e significativa. Ela aprende a apreciar a beleza e a complexidade do mundo natural, compreendendo a importância da preservação para a vida na Terra.

Assim, a pedagogia Montessori valoriza atividades como jardinagem, observação da vida selvagem, coleta de materiais naturais e exploração de diferentes texturas e aromas. Em sua extensa obra a estudiosa traz a reflexão de que essas experiências sensoriais contribuem para o desenvolvimento cognitivo, emocional e social da criança, além de promoverem a conexão com o planeta. Por isso as estações do ano, com suas nuances e transformações, oferecem um rico campo de aprendizado e desenvolvimento para as crianças.

Ao invés de simplesmente observar as mudanças climáticas, a abordagem Montessori convida as crianças a mergulharem em uma jornada de descoberta, explorando ativamente as transformações que ocorrem ao seu redor. Nessa perspectiva, a natureza é um laboratório vivo repleto de oportunidades de aprendizagens.

E de que maneira pais e educadores podem abordar as mudanças de estações tendo como fundamentação os preceitos de Maria Montessori?

No inverno as crianças podem aprender sobre os animais que hibernam, observar a formação de cristais de gelo e explorar a beleza da paisagem invernal. Essa estação também é uma excelente oportunidade para exercitar a solidariedade e a fraternidade entre as crianças, que podem envolver-se, por exemplo, em campanhas de agasalho com vistas ao bem da comunidade em que vivem.

Na primavera, as crianças podem plantar sementes, observar o crescimento das plantas e explorar os insetos que retornam à vida. Esta é a estação perfeita para observar o despertar da natureza, com o florescer das plantas e o retorno dos animais, fato que, de forma geral, estimula a curiosidade dos pequenos.

Na estação do verão as crianças podem observar a vida selvagem, coletar amostras de plantas, e aprender sobre o ciclo da água (beneficiando-se, inclusive, das experiências sensoriais que a água, em todos os seus estados, pode ofertar). Nesta estação atividades coletivas como piqueniques e brincadeiras ao ar livre são ótimas opções para a integração, a criatividade e a fruição dos pequenos.

Por fim, podemos falar da estação que estamos adentrando neste mês de março e que nos proporciona um verdadeiro espetáculo sensorial: o outono. Esta estação, em particular, desperta todos os sentidos e nos convida à contemplação. A transição das cores vibrantes do verão para os tons terrosos do outono oferece um espetáculo visual fascinante. A queda das folhas, com suas diferentes formas e texturas, proporciona uma experiência tátil rica e estimulante.

Quem de nós, adultos, já não viu sua criança interior (ou sua criança de tempos passados) coletando folhas secas? Comparando-as, a fim de perceber suas riquezas de detalhes? Suas incríveis palhetas de cores? Formatos? Quem de nós não traz na memória os sabores e aromas das frutas que brotam no outono?

É sob esta ótica que, em Montessori, podemos dizer que o outono é uma oportunidade para enriquecer as experiências sensoriais de todas as crianças. Além de aprender sobre os diferentes tipos de árvores, observar a textura de suas cascas, entender como os animais se preparam para o inverno, sentir o aroma das frutas da estação, ouvir o som das folhas secas sob os pés, a estação do outono também é propícia para alimentar e ampliar as memórias afetivas das crianças junto de seus pais, cuidadores ou professores: criar obras de arte com folhas secas, fazer colagens com sementes e frutos da estação e preparar alimentos típicos do outono podem ser atividades de vida prática interessantes de se realizar nesta estação do ano.

Montessori nos deixou muito mais que uma metodologia: ela nos deixou uma FILOSOFIA de como viver e aprender em contato direto com a natureza. Para ela, o mundo natural é o maior e melhor ambiente de aprendizagem. E, se queremos abordar a chegada do outono (ou qualquer estação do ano) de forma mais montessoriana, devemos estar atentos ao fato de que a criança aprende mais e melhor quando em contato com sua verdadeira casa: a natureza.

 

*Texto de Cristiane de Ávila Lopes. Pedagoga, Mestre em Educação, Especialista em Método Montessori na Educação, autora da página @aprendermontessori.