A jornalista Carol Pugliesi, 29 anos, é mestranda em Educação Montessori pela Universidade de Barcelona, através do International Montessori Institute e Educadora em Disciplina Positiva de 0-3 anos, pela Positive Discipline Association (PDA). Há alguns anos idealizou, desenvolveu o projeto e fundou a escola montessoriana, Espaço Criançar, em Recife-PE.
Atuou durante quatro anos na área de comunicação da Secretaria de Educação do Estado de Pernambuco, e hoje, realiza e promove atividades, cursos e capacitações com foco no desenvolvimento cognitivo dos três primeiros anos de vida e na Educação Montessori de 0-6 anos. Confira!
´´Em 2009 ganhei um sobrinho e como morávamos juntos, passei a me interessar pelo funcionamento daquele cérebro. Como ele absorvia o mundo com tanta facilidade e como os estímulos poderiam ser salutares para seu desenvolvimento? Alguns anos depois, em 2013, durante minha jornada de elaboração do Trabalho de Conclusão de Curso de Jornalismo, trabalhei com tema sobre a falta de conteúdos infantis de qualidade na tv aberta e o escasso olhar da sociedade para essa idade. Foi quando encontrei uma fala da Doutora Maria Montessori, que associava as crianças a uma classe da sociedade mais banalizada e desrespeitada. Ela comparava crianças a escravos, que ao não obedecerem, eram castigados. Aquilo me impactou de tal maneira que passei a imergir ainda mais na educação infantil e comecei minha graduação em pedagogia. Cursei por um ano, mas logo deixei de lado pois me faltou tempo, já que trabalhava na secretaria de educação com horários de saída indefinidos.
Em 2017, ao analisar o cenário das escolas atuais e da falta de sensibilidade e foco para os três primeiros anos de vida, em que, cognitivamente, nosso cérebro está em intensa capacidade de realizar conexões por meio das sinapses. As janelas de oportunidades para essas conexões são essenciais nos três primeiros anos de vida e quando os estímulos não são oferecidos de maneira correta, podemos perder períodos de aprendizagem que não irão voltar mais. Percebi que o olhar para essas crianças era geral e não individual. Não havia a concepção da criança como unidade ou como indivíduo que possui um tempo diferente do outro, ainda que possa ter a mesma idade. E isso não é visto nas escolas.
Decidi reunir todos os pontos negativos que fui colhendo em minhas visitações por escolas de educação infantil e montei um projeto onde isso seria resolvido e as necessidades das crianças atendidas. Sendo também uma extensão da rede de apoio aos pais e familiares. Para isso, montei uma estrutura que comportasse apenas 50 crianças e nada além disso, de forma que todos os profissionais, do porteiro as auxiliares de serviços gerais, conhecesse cada criança, cada família e suas necessidades.
Hoje, o que mais me atrai no Método Montessori é a autonomia que as crianças adquirem e a heterogeneidade das turmas em ambientes escolares. A promoção da autorresponsabilidade e o fato de perceber nas crianças o sentido de felicidade e satisfação pessoal com o projeto que decidem trabalhar. Principalmente por serem motivadas pelo processo, e não pelo fim.
Vivemos numa sociedade movida pela pressa e imediatismo. Particularmente tenho hiperatividade, o que me gera crises de ansiedade. Percebi, hoje, com os estudos que tenho, que isso foi consequência de uma infância de pouca atenção, onde com meus pais no trabalho, cresci em frente a televisão e com poucos estímulos, que ficaram reprimidos e me fizeram crescer com certas inseguranças. A Educação Montessori nos desacelera. Nos mostra que o tempo é fato secundário, que o processo é o que importa. Que quando estamos focados e concentrados, não podemos de maneira alguma interromper esse processo. Para isso, precisamos identificar os pontos de interesse que mantenham o foco das crianças, e consequentemente as ligações cerebrais.
O Método Montessori nos faz enxergar o outro e suas demandas difíceis. Sempre há uma explicação por trás. Sempre há um porquê de um determinado comportamento, e isso precisa ser levado em consideração. Maus comportamentos, até mesmo de adultos, muitas vezes não vêm de um problema conosco. Não é algo pessoal. É apenas um extravaso de um problema que nós não estamos enxergando. Entendi que o choro, o caos, os desvios psíquicos são respostas de problemas que não estamos vendo.
Queremos tudo de maneira rápida e fácil. Caminhos rápidos, processos rápidos. Vivemos numa era digital onde tudo ocorre em dois segundos. Em minha escola, todos os meus alunos ficam em horário integral, passam quase 12 horas conosco e não temos absolutamente nenhum recurso de tela. Televisão, tablet, absolutamente nada, o que nos mostra ser possível deixar de lado esses recursos que contribuem negativamente para esse desenvolvimento. Fora a pressa, os pais vivem numa eterna guerra interna de serem bons pais e seguir seus trabalhos, mas muitas vezes, por tentar serem presentes, encontram problemas que não existem, aceleram processos desnecessários, e quando é situação inversa, optam por terceirizar o processo de educação, que infelizmente, não nos dá dias de folga. Pais desconhecem seus filhos. Quanto ao ambiente pedagógico, o maior desafio sem dúvidas são os adultos.
Entender que a criança que conduz o processo e sair do foco, quase que anulando nossa própria personalidade para deixar fluir a do outro, é um processo extremamente difícil para nós como seres humanos. Enxergar o outro, ainda mais aquele que temos a cultura se serem inferiores a nós. O que é uma visão totalmente equivocada. A neurociência já nos comprova que as crianças, até os 3 primeiros anos de vida, são capazes de fazer bilhões de novas conexões neurais por minuto. Coisa essa que não somos capazes.
Então somos nós, os adultos, os principais problemas da questão. Até porque, voltando para nossa atual sociedade imediatista, devemos ter em conta que a Educação Montessori, assim como a Disciplina Positiva, são educações a longo prazo. É preciso paciência! Conversa, espera e entendimento. Saber que é um cérebro em formação que necessita de ajuda para conviver com o mundo que o rodeia. A recompensa é simples: a alegria e satisfação de conseguir realizar tudo aquilo que tenham vontade, obviamente dentro dos limites que impomos, ou seja, nada que agrida a si, o outro e ao ambiente, de forma autônoma e dentro do tempo que eles julgam necessário.
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